Pleno sábado de churrasco carioca, se é que quer dizer alguma coisa o ´carioca´. Talvez seja apenas uma vaga lembrança de um espírito que se diluiu e, por pura falta de melhor adjetivo, seja evocado. Mas o fato é que alguns amigos estavam juntos se refazendo no bate-papo.
Havia aquele que insistia nas mesmas gastas piadas e o outro que se renovava em trocadilhos quase infantis de tão descompromissados. Para mulheres, bijouterias sobre a mesa. Era um tal de experimentar cordão: Que pedra é essa? Essa cor combina com a cor da blusa que comprei.
As poucas crianças coabitavam espaços múltiplos que os adultos sequer se deram conta. Quais os adultos que poderiam ver as tantas montanhas que levavam os cavalos à exaustão nas leves elevações do terreno? Quais os perigos que afligiam os coraçõezinhos dos meninos que se entregavam à fantasia?
Nos breves momentos em que a falação cedia espaço para o olhar, alguém comentava sobre o sol inusitadamente quente neste quase inverno de junho. Ou do céu que se prolonga espaço a fora criando os dias absurdamente belos que temos tido a chance de ver, como se a distância entre a terra e o infinito se alongasse levando nossos olhos a se perderem na profundidade azul. Ou quando as sombras das crianças surpreendiam nossa visão, escorregando pelo muro e manchando em forma de gente pequena o chão.
Ah, esqueci de dizer, entre os videntes havia uma amiga cega. Das impressões sonoras que lhe ficaram do churrasco não se sabe. Sabe-se apenas da deficiência que ela despertou em nossa capacidade de comunicação: “Agora eu vou botar vocês em cheque mate! Me expliquem, me façam entender o que é céu, o que é sombra, o que é cor!”
O churrasco continuou. Mas com certeza, alguns não puderam mais continuar a serem os mesmos.